Patrícia e Rafaela
OSCAR 2019: Green Book - o guia
Atualizado: 30 de mai. de 2020
Uma mistura de temas como racismo, cultura e classes sociais em um período de segregação racial
De críticas divididas, opiniões diversas e um certo radicalismo, o filme Green Book - o guia veio para agradar uns e outros nem tanto. Levantando o debate sobre o lugar de fala, o longa traz diretor e roteiristas brancos abordando racismo de uma forma mais leve. Faço parte da turma em que o filme veio para agradar e explico o porque.

Indicado em cinco categorias do Oscar 2019 (melhor filme, melhor ator, ator coadjuvante, roteiro original e edição) Green Book - o guia, baseado em fatos reais e roteiro co-escrito por Farrelly, Brian Hayes Currie e Nick Vallelonga, filho de Tony Vallelonga na vida real, traz uma história do grosseirão com ascendência italiana, Tony Lip (Viggo Mortensen) que é contratado para ser motorista de Don Shirley (Mahershala Ali), um pianista virtuoso afro-americano durante uma viagem de turnê pelo sul dos Estados Unidos nos anos 60.
De início conhecemos Tony Lip, um brutamontes de família Italiana tradicional, com dois filhos e esposa para sustentar, e se tratando da tese; racista. Em cena vemos jogar no lixo com nojo dois copos que haviam sido utilizados por negros, salientando o preconceito. O encontro dos dois personagens se dá pelo fato de Lip estar com pouco dinheiro o que o faz aceitar o trabalho de motorista e guarda-costas de Don Schirley, mas, acaba por encarar o seu próprio racismo na jornada.
O storytelling dos personagens é feito de forma distinta, enquanto já entendemos tudo o que passa no persona de Lip, racista, conservador, mas, no entanto, de palavra. Don Schirley, é uma incógnita; em boa parte do filme se trata de um pianista impecável e reconhecido, solitário, culto e com muitas manias vinculadas a higiene. No entanto, passamos a compreender melhor a personagem na cena em que Don e Tony dialogam no carro após a prisão, Tony lip diz “sou mais negro do que você”, pensamento que se assemelha com algo muito comum nos dias atuais, por exemplo: quem é contra cotas, uma ideia de que apenas o negro de classe inferior é negro de fato. Don Schirley, nos faz perceber algo que a maioria das pessoas não entendem, a combinação da classe social com a raça, já que não importa quanto dinheiro e cultura tenha, sempre terá o preconceito. Ao longo do tempo podemos ver a relação dos personagens se aprimorar e por meio de diálogos (na maioria das vezes dentro do carro) muito bem construídos, vemos surgir admiração e respeito.

A tese central do filme é o racismo; sem dúvidas, mas a escolha de abordagem traz a complexidade das relações humanas, o pianista transcende a “regra” de seu grupo, possui um nível intelectual, educacional, classe, acima da maioria dos negros da população norte americana, portanto, não se sente incluído em nenhum grupo. A narrativa acontece em 1962 no Sul norte-americano antes da Marcha dos Direitos Civis, o epicentro da segregação racial do país, e com humor, foge da proposta esperada em abordar o tema social. Mas isso o torna interessante, pois envolve um lado artístico e que talvez, possa vir a surtir mais efeito. O título “Green Book’ é uma referência ao guia de viagem que indicava para os afro-americanos os hotéis que seriam aceitos e a riqueza da narrativa está na mistura de temas como classes sociais, racismo e cultura.
É um filme que fala sobre aceitação (de si e do outro), e no fim das contas é muito mais do que um filme baseado em fatos reais.
Takes concentrados em fundo desfocado e primeiro plano, atuações impecáveis de Mahershala Ali e Viggo Mortensen que vale a comparação da atuação em Capitão Fantástico onde os personagens são tão distintos, trilha sonora nostálgica de Kris Bowers (um pouco forçada), um roteiro sob perspectiva da lembrança de Tony Vallelonga, o tom de humor com algumas cenas que faz o espectador refletir acerca do que se propõe; fazem do longa uma boa sugestão de filme. E por fim, fala do próprio “mudar o coração das pessoas requer coragem”.
Beijos, Patrícia L.